sábado, 17 de fevereiro de 2007

Life is a cabaret

Ela entra todos os dias à mesma hora no cabaret. Vai para os bastidores e veste aquela roupa minúscula e maquilha-se devagar. Olha para o espelho e diz que hoje não tem vontade de se despir. Mas estão todos à espera dela.
Finalmente vai para o palco e a sala está iluminada com aquela luz vermelha. No palco só está ela e uma cadeira.
Começa a movimentar-se ao som da música e lentamente vai olhando para todos os olhos postos nela. A maioria são de homens que percorrem todo o seu corpo. Também há mulheres. Essas olham-na de uma forma diferente. Têm curiosidade de saber como será estar ali na pele dela e quem será ela na realidade, fora daquele cabaret.
Ela vai tirando a roupa e senta-se na cadeira. Naquele momento há um problema técnico e a musica pára. Aí ela já não sabe para onde olhar e onde colocar as mãos. Começa a mexer no cabelo e espera que a musica recomece novamente.
A musica começa a tocar e ela continua a despir-se até ficar nua. Olha com um olhar sensual para aquelas caras em frente a ela. O desejo paira no ar e ela sai do palco.
Já acabou e ela tira a pintura da cara e logo a seguir veste uma camisola e uns jeans.
Depois veste o seu casaco quentinho, põe o cachecol e sai do cabaret.
A sua casa é a 1 km dali. Ela caminha devagar na noite e ouve o silêncio nas ruas. Só se ouvem os saltos das botas dela na calçada.
Olha para uns sem-abrigo que dormem nas escadas de um cinema.
Aparece também o camião do lixo e os homens que recolhem os contentores. Mas não a vêem. Ela gosta disso. Ninguém a conhece.
Chega ao prédio onde vive, sobe as escadas e abre a porta. O cão que vive com ela vem recebê-la e parece contente.
Ela faz-lhe festas no pêlo macio e vai à cozinha preparar um chá. Coloca um cd de musica calma, que tanto gosta.
Depois senta-se no sofá da sala e abre o livro do Paul Auster que anda a ler enquanto bebe o chá quente.
Ela adora ler e perde-se no tempo. Quando se apercebe, acabou de ler o livro e o dia amanheceu.

Sem comentários: